O mercado brasileiro de games vive tempos muito diferentes se olharmos a apenas uma década atrás: nesse curto período, uma nova geração de consoles apareceu, os games nacionais começam a ganhar terreno antes exclusivo de produções estrangeiras e novos projetos têm surgido, como é o caso de Tukolk, proposta de console produzido a partir de Arduino, agora em campanha de arrecadação no Kickante. Resultado das pesquisas incessantes de Fabrício Kolk e André Oliveira, responsáveis pela rede social Kolk Games e pelo canal Tukanime, respectivamente, o Tukolk se propõe como um veículo não apenas para a criação de games em sua plataforma específica, mas também para projetos artísticos e educacionais que podem se utilizar das especificações do hardware.
O Play’n’Biz conversou com Fabrício, idealizador do projeto, e conheceu a fundo a proposta, como segue na entrevista abaixo:
Play’n’Biz – Como surgiu a ideia de criação de um hardware baseado em Arduino para games?
Fabrício Kolk – Esta é uma pergunta muito boa. Eu, Fabrício, fiz técnico em eletrônica e sou formado em Sistemas de informação. Desde a época do técnico, tinha uma curiosidade grande sobre o funcionamento de um console, por mais simples que fosse.
Lembro-me de ter desmontado um “Tamagochi” para tentar compreender, sem muito sucesso. Quando fiz sistemas de informação, o problema era outro, o curso todo era focado no chamado alto nível, isto é, nas camadas de software para cima, sem dar ênfase no lado eletrônico. Queria unir os dois mundos e criar o meu próprio console.
Conheci então o grande André Oliveira, o Tuka, que possui o sensacional canal do youtube, “Tukanime”, e resolvemos mergulhar nesse desafio. Foram meses de persistência e resiliência à frustração, pois não encontrávamos facilmente as informações que precisávamos. Mas a persistência aliada ao trabalho sempre se paga e está ai hoje o projeto disponível na Kickante, para quem quiser adquiri-lo.
P’n’B – Qual o público alvo do projeto? O público não-Geek e não especialista em informática e programação pode se divertir com o recurso e conseguir bons resultados? E os jovens e crianças?
FK – O público alvo do projeto são aqueles interessados em aprender e pesquisar mais sobre o desenvolvimento de jogos, interessados em Arduino, programadores que queiram compreender e aprender mais sobre os fundamentos do desenvolvimento de um console.
Artistas, designers, compositores, estudantes, entusiastas ou qualquer pessoa envolvida ou interessada no ecossistema do desenvolvimento de jogos, ou aqueles que queiram utilizar o Tukolk para outros fins e aplicações gráficas e interativas que não necessariamente jogos.
O Tukolk é composto de um hardware baseado em Arduino, o software de um jogo embarcado, e um livro com informações técnicas tanto do baixo nível, isto é, elétrons, portas lógicas, maquinas de von Neumann, lógica booleana, quanto em alto nível, explicando fundamentos de programação, computação gráfica e como foi o desenvolvimento do console e do jogo.
Tentamos deixar o texto o mais simples e direto possível, mas sem menosprezar algumas áreas importantes. Se por exemplo, fôssemos explicar em pormenores o funcionamento da tela LCD e TouchScreen, daria um livro de 400 páginas só para isso. Então, mantivemos o foco nas informações relevantes para o desenvolvimento de games. Os não especialistas podem conseguir bons resultados, afinal, se optaram pelas recompensas é porque têm interesse em pesquisar a área.
Acho que os jovens e crianças hoje em dia são muito espertos, inclusive diversos programadores começaram nessa faixa etária, com pequenos programas.
Acho que o Tukolk poderia ser uma porta de iniciação no desenvolvimento de jogos para esse público, colocamos um jogo bem simples introdutório que com um pequeno esforço dos não iniciados, pode ser compreendido.
O projeto tem o mérito de pegar vários conceitos que são considerados chatos e mostrar como são aplicados no projeto, da Álgebra Linear aplicada a computação gráfica até as portas lógicas, tudo em um projeto divertido de jogo.
P’n’B – O sistema também prevê a possibilidade de criação dos próprios games para o equipamento. É necessário saber programação em algum sistema específico ou quais os conhecimentos necessários para criar os jogos?
FK – Para se criar os próprios games, a IDE, isto é, o ambiente de desenvolvimento de aplicações do Arduino é utilizado.
A linguagem do Arduino é implementada usando as linguagens C/C++ e a biblioteca Wiring, que é um framework de programação open source para microcontroladores. A linguagem Wiring por sua vez foi inspirada na Processing, o que fez com que o Arduino herdasse a estrutura da linguagem Processing.
Apesar dessa descrição mais técnica, a programação não é complexa, os jogos são programados de forma bem simples e com poucas linhas de código é possível fazer muitas coisas. Aqueles não versados na arte da programação podem estudar o nosso livro e o jogo embarcado e começar a fazer coisas bem legais. É um ótimo incentivador para quem quer começar a aprender programação, pois você pode desenhar o que quiser na tela, sem precisar saber de muita coisa. O livro explica como os gráficos são desenhados, então é um ótimo motivador para quem quer começar a aprender programação, pois infelizmente ou felizmente, programação se aprende programando, não em cursos ou faculdade. É como fazer jogos, só se aprende fazendo, colocando a
mão na massa, e certamente é muito mas empolgante programar gráficos ou um jogo do que sistemas de banco e calculadoras!
P’n’B – A meta de arrecadação no Kickante é de apenas R$ 5 mil, um valor bastante baixo para a média dos projetos de crowdfunding em geral. Com essa verba é possível desenvolver a produção em caráter comercial ou que outras etapas serão necessárias para colocar o produto no mercado?
FK – O projeto já existe, já temos o protótipo pronto, como pode ser visto no vídeo da campanha:
O projeto é todo aberto como pode ser visto no vídeo, com as partes eletrônicas expostas de propósito, pois queremos que as pessoas desvendem a caixa preta que são os consoles!
O valor arrecadado é em caráter de pré-venda, pois já realizamos a pesquisa e o desenvolvimento do produto. Tentamos equilibrar o preço com a proposta e foi um verdadeiro desafio no nosso país com tantas taxas e impostos. Mais de 90% do nosso preço constitui custos, pois queríamos entregar um produto com um preço compatível com a realidade do nosso público. Então sim, é possível realizar a comercialização do produto com esse valor, porém, como somos pequenos o projeto está limitado em no máximo 650 unidades. Não temos no momento uma estrutura maior para aumentar a produção, então caso alguém tenha interesse no projeto é bom correr e garantir o seu!
P’n’B – A Kolks Games é reconhecida como uma rede social para desenvolvedores brasileiros de jogos. Qual o envolvimento da empresa/produtores com a criação de gadgets como o Tukolk e como isso se alinha ao conceito original do projeto?
FK – O projeto Tukolk nasceu da parceria da Kolks Games com o canal Tukanime.
O envolvimento de ambos é total, pois foi uma proposta que nasceu dessa parceria, tanto no desenvolvimento do projeto quanto na sua execução e implementação.
O alinhamento se dá na preocupação de trazer sempre mais informações e oportunidades para a realidade do desenvolvedor brasileiro. Estamos implementando na Kolks Games uma seção de cursos online, aonde os desenvolvedores poderão publicar cursos e ganhar dinheiro com isso, e o canal Tukanime realizou já diversas entrevistas com desenvolvedores.
Todas as iniciativas visam ajudar e tentar contribuir para que o mercado cresça, tanto com informações como com ferramentas para os desenvolvedores, estudantes e entusiastas da área de games.
P’n’B – Já existem exemplos de games criados com o sistema? Qual o nível de desenvolvimento alcançado em termos de level design, visual, tempo e duração dos jogos e outros aspectos próprios dos games da atualidade?
FK – Já temos games sim e o sistema virá com o jogo que aparece no vídeo embarcado, além do seu código fonte e explicações de funcionamento. Acredito que não faça muito sentido comparar com os jogos da atualidade, pois o nosso foco é outro, encaramos o console como uma ferramenta educacional no melhor sentido que esse termo possa ter, para ajudar a todos os interessados em linkar conceitos teóricos em percepções práticas.
Nada impede no entanto que os desenvolvedores criem jogos cada vez melhores e mais sofisticados com o sistema, alias, esperamos que isso aconteça e que compartilhem os jogos com os demais desenvolvedores, de forma a criarmos uma grande rede colaborativa de troca de conhecimentos na área.
P’n’B – Quanto tempo foi empenhado na pesquisa do projeto e quantos profissionais estiveram diretamente envolvidos na criação do Tukolk?
FK – Bom, profissionais envolvidos na criação foram 2, tanto na pesquisa quanto na execução, que foram o André Oliveira (Tuka) e eu (Fabrício Kolk).
Sobre o tempo de pesquisa, podemos considerar o tempo formal e o tempo informal. O tempo informal seria todo aquele tempo empregado durante anos, para tentar desvendar os tópicos abordados no projeto. Esse tempo não sei lhe precisar, mas foram muitos anos. Agora, o tempo formal, que compreende do ponto em que decidimos efetivamente iniciar esse projeto até o ponto atual que o temos pronto, por volta de 1 ano e meio.
P’n’B – O projeto prevê updates de hardware, sistema ou na facilitação da criação de jogos?
FK – Todos esses pontos dependem do desempenho do console na Kickante! Só então poderemos desenhar os passos futuros. Mas, como se trata de um projeto aberto, a ideia é que a comunidade, caso surja uma envolta do projeto, possa ajudar a crescer o sistema, trocando entre si projetos.
Podemos também prever outras ações como criações de cursos, novos jogos, mas é muito cedo para avaliar.
P’n’B – Há previsão de uso da rede digital para interação com outros usuários do sistema?
FK – Sim, queremos utilizar da rede Kolks Games para isso. Criamos um grupo lá para que os interessados possam trocar projetos, experiências, dúvidas e demais pontos. O endereço é: http://www.kolksgames.com.br/group/44
A vantagem de se utilizar a Kolks Games é que possui uma estrutura cronológica e de relevância nos tópicos de seus grupos, o que facilita para que o conhecimento não se perca. Em comunidades ativas do Facebook por exemplo é comum não encontrar notícias interessantes de semanas ou dias passados, o que faz com que o conhecimento se perca. Utilizando a Kolks Games isso não tem como acontecer, pois todos os posts geram uma barra de tópicos cronológica, que pode ser sempre consultada, “guardando” o conhecimento.
P’n’B – Como o público pode contribuir com o projeto?
FK – Gostaríamos de pedir a ajuda da comunidade para que possamos entregar o melhor produto. Sugestões, ideias, críticas, por favor nos escrevam! Queremos aprender com o público e queremos que o público seja co-criador deste projeto. Escrevam para: tukolkgames@gmail.com
Gostaríamos também de agradecer a todos e de dizer que estamos criando um projeto que gostaríamos que alguém tivesse criado para a gente, pois esse é um sonho antigo nosso! Esperamos que todos possam aproveitá-lo!
A campanha permanece no ar até 18 de março de 2015, no Kickante e você pode contribuir para auxiliar o projeto e garantir seu console especial.
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