É muito provável que qualquer pessoa interessada em games no Brasil já tenha sabido que o projeto Toren, do estúdio Swordtales, de Porto Alegre, sairá, em 2015, para o console da Sony PS4. A equipe gaúcha não esconde a alegria com esta conquista e segue com a produção que, afirmam, estará disponível em várias plataformas no primeiro semestre do próximo ano.
O Play’n’Biz conversou com Alessandro Martinello, Diretor Criativo do estúdio e do projeto, que contou detalhes sobre o longo trajeto de produção, as dificuldades encontradas e a qualidade do trabalho realizado, entre outros assuntos. De fato, embora pareça demorada, uma produção como essa leva usualmente de 3 a 4 anos para ser finalizada, com custos nem sempre contabilizados em sua totalidade, levando os desenvolvedores a decisões difíceis e penosas para entregar seu produto no prazo e dentro do orçamento previsto. Não é o caso de Toren que, de acordo com Martinello, segue dentro do cronograma definido e não custará nada além do financiamento conquistado a partir das captações de recursos possibilitada pela aprovação do projeto na Lei Rouanet. “Com muito esforço, cumprimos todos os prazos e gastamos as quantias certas”, confirmou o artista, em entrevista concedida por email. Ainda que apresentado como um projeto indie, Toren tem todas as características dos jogos de primeira linha produzidos pelos grandes estúdios e seus custos podem assustar àqueles que acreditam que jogos independentes são desenvolvidos na garagem da casa, com um par de amigos programadores. “Um jogo como o Toren custa 1 milhão de dólares ou mais. O custo mensal de um projeto deste passa de 10 mil reais ao mês, e estamos sendo bastante eficientes e exemplares”, afirmou, observando que foram poucas as surpresas e imprevistos encontrados ao longo da realização do trabalho, o que demonstra a expertise do time enxuto de produtores da casa. Alessandro ainda explica que são inúmeros os valores despendidos com as necessidades do dia a dia em uma empreendimento do gênero: Os gastos vão desde profissionais com carteira assinada e assessoria jurídica até trilha sonora e efeitos de som”, comentou.
Apresentando como um “poema épico visual”, Toren é um dos grandes projetos de games da recente geração de produções nacionais e parece já contar com ótima aceitação dos jogadores locais, em razão de suas qualidades gráficas e de roteirização, segundo acredita o desenvolvedor: “Acho que a linguagem mais artística e forte sempre existiu nos games. Desde Prince of Persia, nos anos 90, até Journey, em 2012, este tipo de iniciativa autoral e artística sempre esteve presente no meio. O jogo sendo bom, o público acabe se interessando e o preconceito típico é cada vez menor”, acredita. Martinello vai além, afirmando que o publico trata com muita naturalidade o Toren e outros jogos nacionais, até mesmo retros. “Minha percepção hoje, após toda a repercussão de um jogo brasileiro no PS4, é que é algo natural e que as pessoas vão cada vez mais tratar como tal. Conquistaremos o mercado interno fazendo por merecer”, analisa. “Hoje está dificil fazer piadas com um game com o visual e as conquistas que o Toren e outros jogos têm.
Houve, no entanto, momentos de grande tensão, onde o cancelamento do projeto chegou a ser seriamente considerado, frente às dificuldades encontradas no processo. “Ele quase foi cancelado, mas nunca houve este momento de encerramento, apenas um período em que trabalhávamos sem saber se iria acontecer um cancelamento ou a venda de algo inacabado. Quando conseguimos o dinheiro, decidimos refazer o jogo com o que tínhamos aprendido, até chegar em algo ideal, já que tínhamos a quantia necessária”. O aporte financeiro possibilitado pela aprovação do projeto na Lei Rouanet, no início de 2013, permitiu não apenas a continuidade do projeto, mas criar expectativas na Swordtales para a realização de novos trabalhos, que já seguem em processo de criação, embora o foco, no momento, seja o trabalho em andamento. “Se aparecer mais dinheiro, ele será usado nos próximos projetos, pois tudo foi planejado para o Toren usar apenas este dinheiro no prazo correto e ser o melhor possível. Não faltará dinheiro para deixar o jogo como o publico merece graças a muito planejamento e trabalho”, destaca, com entusiasmo.
Além das belas imagens já largamente exibidas na rede, o jogo conta também com uma trama de busca interior que se reflete na jornada da personagem Childmoon, na torre que dá o título do projeto: “O jogo é uma escalada de desafios, subindo a torre até os céus, passando por vários obstáculos como puzzles e varias batalhas com um dragão em cada estágio da vida”, contou o designer, acrescentando detalhes de narrativa que caráter eminentemente poético. “Também trabalhamos a ideia dela [a menina] escalar a árvore da vida e cuidar dela, um conceito religioso muito presente na busca pela iluminação”.
A Swordtales segue para a etapa final da produção com ânimos renovados pelas conquistas recentes e também pelo fato de haver grande expectativa em vários países com o projeto. “Depois do anuncio do PS4, eu li em todas as línguas que pode-se imaginar que é um jogo muito esperado, já que Last Guardian não sairá tão cedo”, ponderou. “Independente disto, há uma carência de jogos assim e creio que este publico está disposto a comprar vários, já que o mainstream não é capaz de oferecer experiências assim”.
Aos interessados na imersão proporcionada pelo trabalho pode-se afirmar que o game terá duração aproximada de 3 a 4 horas, segundo seus criadores. “A gente considera este tempo o ideal pra jogos indie mais densos. O jogo não possui partes arrastadas ou para fazer volume; o time considera melhor uma experiência densa e rica de 4 horas de duração, que uma distraída e aguada de 15h”, observa.
A empresa confirma o lançamento do game para as plataformas Linux e Steam, além de PC e, agora, PS4. “Lançaremos para todas as plataformas no mesmo dia. Há uma vontade de ver o Toren em mais plataformas e podem acontecer anúncios futuros, mas no momento não sabemos se vale a pena”.
O game recebeu Menção Honrosa no Independent Games Festival, título de “Melhor Jogo de PC” no E-Games Awards, foi finalista na categoria Art Design no IndiePub e premiado na Brasil Games Show, mas os designers mantém a humildade, certo das qualidades do projeto, mas cientes que muito ainda pode ser feito pelo design de games no país. “Blockbuster é sonhar demais”, desconversa Alessandro. “Esperávamos premiações mais por estarmos tentando algo que a maioria dos estúdios já tinha desistido de fazer na época do que por acharmos que estava bom. A grande e grata surpresa foi ver, ao longo do tempo, que virou lugar comum fazer jogos bonitos e ousados para entretenimento no Brasil”. O desenvolvedor ainda postula que os jogos, a despeito das afirmações infelizes da ministra Marta, são uma nova forma de arte: “Para mim, apesar de jogos serem peças extremamente técnicas, elas são arte desde sempre. E os jogos que costumam ganhar este rótulo são aqueles que tem o menor ruído possível ao passar a imersão para o jogador. Jogos são pura expressão e já conquistaram este patamar”, define.
O game está previsto para lançamento já no início de 2015 e, a julgar do empenho dos profissionais envolvidos, o jogador pode esperar um grande projeto com uma pontualidade rara de se ver nesse meio, onde atrasos são comuns em trabalhos desse porte. “Estamos fazendo de tudo para poder lançá-lo na primeira metade do ano, onde os jogos indies são mais apreciados”, finaliza.
E sobre os próximos jogos, Alessandro? “Já existem dois, e não podemos falar sobre isso”.
O Play’n’Biz agradece a generosa disponibilidade para a entrevista e as respostas enviadas pelo estúdio.
Sensacional! Torço por esses caras e estou ansioso para jogar!