Muito tem se falado sobre Gamificação nas várias áreas de atuação, como a corporativa e a educacional, mas não são muitos os exemplos práticos que encontramos aplicados no país. O grupo Sciencia, startup sediada em Campinas, São Paulo, apresenta o primeiro curso com uma plataforma gamificada voltado à educação que se tem notícia por aqui. Para explicar como funciona o sistema e quais as perspectivas do projeto, Nilton Machado, Mestre em Educação pela Unicamp, conversou com o Play’n’Biz. Formado em psicologia pela Adams State University, Nilton já atuou como professor, psicoterapeuta, coach, orientador profissional, e hoje empreende este novo projeto.
Play’n’Biz – Este é, de fato, o primeiro curso ‘gamificado’ do país?
Nilton Machado – De acordo com as nossas pesquisas, este é sim o primeiro curso gamificado sobre a gamificação da educação que acontecerá dentro de uma plataforma gamificada no Brasil. É a gamificação elevada ao cubo (risos). Realmente não encontramos indícios de que mais alguém tenha lançado um curso com essas características. Mas se por acaso alguém aparecer, a gente divide o badge sem problemas. = )
P’n’B – Como foi desenvolvido o curso e quais os aspectos mais importantes a serem salientados no que tange ao uso de gamificação no processo educativo?
NM – Meu objetivo foi desenvolver o curso do ponto de vista de um designer de jogos e enxergar os participantes como jogadores, buscando sair da relação puramente de professor/aluno e experimentar elementos da relação designer/jogador. Busquei promover autonomia, interação entre os jogadores, colaboração, competição saudável, fluxo e, claro, diversão. ‘Players play‘.
Em seu percurso, eles passam por uma série de desafios projetados para gerarem o que Katie Salem, CEO do Institute of Play, chama de a necessidade de aprender (“the need to know“), um elemento muito ausente na educação, infelizmente. Nesse contexto, a ideia é instigá-los a aprender. Trabalhamos para que os alunos sintam que são protagonistas do seu processo de aprendizagem, para que aprendam de forma significativa, e que se divirtam.
Através da plataforma, eles poderão adquirir pontos e badges no processo, mas o foco principal está em comunicar o valor da experiência em si: adquirir novos aprendizados e colocá-los em prática em um projeto real (de aulas gamificadas, por exemplo).
Embora essa não seja a minha formação, quando comecei a me interessar por gamificação, em 2011, percebi que já detinha os conhecimentos fundamentais para a gamificação ser efetiva: as teorias sociocognitivas da motivação (motivação intrínseca e extrínseca, por exemplo).
Pesquiso essa nova área do conhecimento desde então, e sou fã do trabalho de Jane McGonigal, Katie Salen, Gabe Zichermann, Kevin Werback, Jessi Shell, Sebastian Deturding e Mark LeBlanc, entre outros.
P’n’B – Qual é o conceito de ‘blended learning’, utilizado no curso, para informar àqueles que desconhecem o termo e a forma de atuação?
Cito sempre a definição de Michael B. Horn e do pessoal do Instituto Christensen. Esses caras têm pesquisado muito as novas iniciativas de blended learning. É tudo muito novo, e a coisa tem mudado tanto nos últimos anos que eles precisaram adotar diretrizes flexíveis que dessem espaço para a inovação constante da própria definição desse conceito.
O blended learning, ou aprendizagem híbrida (popularmente conhecido como ensino híbrido no Brasil, embora essa terminologia não seja condizente com o conceito), ocorre quando há entrega de conteúdo online e os estudantes possam acessá-lo e realizar atividades pertinentes ao tema com uma certa autonomia. É uma condição também que os estudantes compareçam a encontros presenciais em um local oficial do curso.
O “flipped classroom” (aula invertida) é uma das manifestações do modelo de rotação da aprendizagem híbrida. Coincidentemente, o curso “Ensino Híbrido: Tecnologia para Motivar”, que ministrei em março desse ano através da Sciencia, também foi o primeiro no Brasil do gênero. Logo em seguida a Fundação Lemann traduziu o blended learning do Coursera. Foi muito legal poder compartilhar esses conhecimentos tão novos com educadores de São Paulo, Campinas e região.
P’n’B – Haverá a mesma capacidade de apreender o conteúdo na versão presencial e online ou haverá diferença no aproveitamento de conteúdo entre os diferentes formatos?
NM – Sim, quem fizer o curso online poderá aprender sobre a gamificação da aprendizagem tão bem quanto quem fizer a versão híbrida do curso. A entrega de conteúdo será online para todos. Haverá hangouts (encontros online) para dúvidas e orientação dos projetos. Quem fizer a versão online também vai poder desenvolver o projeto.
Vai também poder criar novas conexões e fazer novas amizades através da nossa plataforma. Só não vai poder trabalhar com os colegas nos encontros presenciais – que geralmente ajudam a criar um vínculo mais forte com o curso. Então minha forma de compensar isso vai ser através dos hangouts e interações na plataforma.
P’n’B – Como a administração do curso pretende aferir os resultados de assimilação de conteúdo pelos participantes do curso?
NM – Haverá quizzes na plataforma, porém a melhor forma de saber se a aprendizagem foi mesmo significativa é ver a sua aplicação no mundo real.
Esse é um curso embasado em projetos, eles serão avaliados pelos projetos e não só por mim. Pelos colegas também, e possivelmente por seus próprios alunos.
P’n’B – O curso será certificado?
NM– Sim, será. E quem entregar o projeto terá um certificado especial.
P’n’B – Qual o histórico da empresa desenvolvedora do projeto na área educacional e quais outros projetos já foram realizados utilizando sistemas de games/gamificação?
NM – Sou psicólogo, psicoterapeuta, coach e mestre em educação pela Unicamp. Criei a Sciencia em 2012 e, desde então, ministramos oficinas principalmente em escolas do estado de SP. Já demos oficinas do Rio de Janeiro e Minas Gerais também.
Nossas oficinas sempre foram gamificadas. No início eu usava Prezis para lançar desafios para grupos diferentes, e adicionava outros elementos dos jogos dentro do possível. Teve uma oficina no Rio para a qual criei um jogo chamado “Pandemia” – um vírus desconhecido estava transformando as pessoas em zumbis (elas não conseguiam mais aprender) e apenas as crianças poderiam ser curadas. Os professores tiveram que criar inovações para o sistema educacional. Foi bem interessante, mas um desafio. Como não tínhamos internet, tivemos que imprimir todo o material.
Outro experimento especificamente dentro do game-based learning aconteceu nas oficinas desse ano. Criei um jogo de tabuleiro no estilo Scotland Yard, cada lugar no tabuleiro era uma iniciativa inovadora na educação: a Quest to Learn, o Projeto Gente, o Instituto Christensen, etc. Ao entrar nos lugares, os jogadores recebiam uma pergunta e pistas. Tinham que pesquisar as respostas na internet. Esse jogo tem dado muito certo, embora estivesse muito difícil no início. Fiz modificações e agora está melhor.
P’n’B – O curso é pago? Como cobrar um valor justo para um projeto dessa ordem sem que o custo seja elevado para o bolso dos interessados?
NM – O curso é pago, temos muitas contas para pagar (risos). A versão online está com o valor bem acessível, na minha opinião. A versão híbrida, com encontros presenciais, precisa ter um valor maior, devido ao custo do aluguel do espaço.
Acredito que o fato da maioria dos MOOCs serem gratuitos tem contribuído para a falta de engajamento e interesse dos alunos em terminar cursos dessa natureza. O problema é justamente esse formato – o curso é desvalorizado. Veja o caso do Veduca: de 15.000 inscritos no primeiro grande curso online da América Latina, só 5 terminaram.
P’n’B – Então, faça seu convite aos potenciais interessados no curso, Nilton:
NM – A utilização da tecnologia na educação, quando ocorre, é feita geralmente de forma expositiva e unilateral, sem inovação das práticas educativas. Além disso, a maioria das pessoas desconhece o potencial motivacional do uso de elementos dos games em outros âmbitos. O objetivo do curso é apresentar aos participantes o que há de melhor nos jogos e na aprendizagem híbrida, para que eles possam aplicar esses conhecimentos em suas próprias realidades e públicos. A gamificação da aprendizagem pode ser aplicada a todas as idades.
O projeto conta com a expertise dos profissionais Guilherme Solinscky, gestor de tecnologia e sócio, Carolina Rossi (comunicação), Julian Nunes (programador), Marcela Carpes (consultora RH), Maich Bernardes, investidor do projeto e o próprio professor Nilton Machado.
O curso acontece entre os dias 25 de gosto a 27 de setembro, com previsão de três encontros presenciais de 3 horas e meia, nos dias 30 de agosto, 13 e 20 de setembro, no Instituto Mackenzie de Campinas, para os alunos inscritos online.
Inscrições e informações podem ser obtidas através pelo telefone (11) 986537441 ou do contato carolina@projetoasimov.com. As vagas são limitadas.
Website: Sciencia
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