Não bastassem as dificuldades com mão de obra, recursos técnicos, custos gerais e impostos elevados para se desenvolver jogos no Brasil, o produtor ainda se depara com as agruras de disputar espaço, atenção e respeito à sua produção em eventos voltados à linguagem de games. Na Brasil Game Show, ao que tudo indica, não faltam demandas a serem vencidas também junto à organização, que em muitos momentos parece não saber dialogar com a produção nacional de jogos.
Ainda que essa percepção possa parecer eventualmente injusta com os organizadores, que ao fim das contas buscaram condições para viabilizar a participação dos criadores locais de games na feira, boa parte dos expositores presentes à edição 2014 e desenvolvedores participantes do pavilhão business ouvidos informalmente na noite de sexta-feira e durante o sábado pela reportagem, apresentavam desagrado com certos aspectos curiosos e procedimentos exigidos pelos representantes do evento.
Entre as impressões mais recorrentes, destaca-se a sensação de um corpo organizacional pouco atento aos apelos por adequações e ajustes para transformar o espaço expositivo em um ambiente capaz de fazer justiça ao pomposo nome ‘Pavilhão Indie’, com situações que envolvem dificuldade no trato com os interlocutores da feira e questões pontuais inusitadas, como a necessidade de contratar serviço de segurança individualmente para cada stand no período de fechamento da feira ou insumos inesperados, como a locação de extintores de incêndio.
Nas rodas de bate papo formadas ao acaso entre os indies brasileiros, não era difícil ouvir expressões de insatisfação em relação à falta de um planejamento mais apropriado à infraestrutura dos stands, como localização e instalação no espaço expositivo, e a falta de uma visão estratégica para valorizar o trabalho dos desenvolvedores independentes.
“Os stands estão localizados no fundo da feira, perto do banheiro, e sem qualquer destaque que chame a atenção do público”, disse um dos expositores, que precisou entrar em um delicado momento de discussão com os representantes da organização para realocar seu stand, que estava originalmente voltado para a parede de fundo da pavilhão, completamente isolado e fora de visão do grande público. “Tivemos que mudar para um espaço na parede de fundo próximo aos sanitários, para ficarmos de frente para os visitantes e mais visíveis”, contou o produtor.
Em situação semelhante, o stand da ThinPlay, loja de jogos online em lançamento no evento, permanece escondido no fundo do centro de exposições, sem qualquer destaque que possa chamar a atenção do visitante ou conduzi-lo até o local para conhecer a empresa e suas novidades. Curiosamente, em uma conversa informal com os representantes da loja online, a reportagem não ouviu palavras de desagrado.
Outra reclamação comum referia-se ao Pavilhão Business, espaço reservado às reuniões para negócios. “É longe, mal localizado e não tem qualquer atrativo”, disse um dos interlocutores ouvidos pelo Play’n’Biz, acrescentando que a dificuldade em ser encontrado pelos interessados fez com que optasse por realizar suas reuniões em outros espaços do evento. Outro expositor complementou as informações recebidas e afirmou que as reuniões atrás do stand, “junto à parede do fundo”, acabaram se mostrando mais positivas. “Recebi investidores e reportagens lá no fundo”, relatou. Mais curioso foi o relato de expositores que não conseguiram utilizar a área Business por não portarem crachás VIP. “Nem com pessoas com crachá de imprensa conseguimos ter acesso ao espaço para fazer reuniões”, disse um Game Designer.
Vale ressaltar que a produção e realização de um evento desse porte é uma tarefa monumental, que exige atenção a muitos detalhes e envolve várias equipes, que precisam ser adequadamente orientadas a atender às situações que se insurgem, algumas delas eventualmente inesperadas, mas a recorrência patente com que tantas reclamações foram apresentadas por diversos profissionais denota a necessidade de um olhar mais atento da produção do evento em relação aos indies brasileiros.
Por outro lado, se serve como motivo para atenuar as crítica ouvidas na feira, havia entre os produtores quem não reclamasse das condições e exultasse a visibilidade alcançada no evento, a exemplo dos criadores de Aritana e a Pena de Harpia. “Nunca tivemos uma exposição tão grande e essa receptividade de público. Esse feedback é excelente!”, comemorou Pérsis Duaik, comentando o interesse do público no jogo sobre o personagem indígena. Orlando Fonseca, da Imgnation, e parceiro constante da Swordtales, também presente ao evento, afirmou que, apesar destas questões pontuais, a participação na feira também está contabilizada de forma muito positiva pelos criadores de Toren, em razão da visibilidade e da forma como jovens e crianças se encantam com o game.
Ainda na noite passada, Marcos Gonçalves, representante da IGDA-SP comentou em uma conversa online na rede social que, aparentemente, pode haver boa receptividade da organização à ideia de um stand conjunto para 2015, com vários indies expondo seus trabalhos simultaneamente. “Hoje (sábado), eu fui no estande de vendas para a bgs 2015. Me apresentei e o vendedor foi muito receptivo à ideia de haver uma ala conjunta no futuro pros indies… ele pediu para eu gerar mais detalhes, compilar os feedbacks bons e ruins e mandar para ele num email depois da feira”.
Talvez o melhor resultado dessa participação dos indies na BGS 2014 seja a geração de um rico debate, que pode culminar em um apoio expressivo da organização do maior evento de games do Brasil ao time de profissionais que tem tudo para revolucionar o mercado de entretenimento digital nos próximos anos e consolidar a cultura de games no país.
Faça o primeiro comentário a "Para Indies, apesar de oferecer espaço no evento, BGS tem dificuldade em dialogar com desenvolvedores nacionais"